Fragmentos poéticos de Lucio Cardoso

“A Fernando Ferreira de Loanda 

esta imagem escura e deformada 

de alguém que vi um dia 

em corpo inteiro, nítida, não sei 

em que cenário e em que dia distante

Lucio Cardoso

Rio, 47

Lucio Cardoso fez essa dedicatória ao escritor Fernando Ferreira de Loanda em seu livro “Inácio”, o primeiro da trilogia “O mundo sem Deus”, que se completa com as obras “O enfeitiçado” e “Baltazar”, sendo esta última uma publicação póstuma. “Inácio” foi publicado pela primeira vez no ano de 1944 e conta, de maneira instigante, sobre a vida de Renato em uma pensão e os mistérios que o rondam depois de ser interceptado por um estranho que diz que vai lhe matar. Renato então pergunta se não estava sendo confundido por Inácio, levando a narrativa uma atmosfera ainda  mais inebriante e cabalística. 

O autor, nascido como Joaquim Lucio Cardoso Filho, nasceu em 14 de agosto de 1912 na cidade de Curvelo, Minas Gerais e foi dramaturgo, escritor, roteirista, produtor, diretor e até pintor. Na dramaturgia, foi roteirista e coprodutor dos filmes “Almas adversas” (1948) e “A mulher de longe” (1949) e também foi um dos criadores do Teatro de Câmera. Dentre suas produções estão os livros “Diários”; “Maleita”, “A luz no subsolo”, “Contos da ilha e do continente”, “Dias perdidos”, “Salgueiro”, “Mãos vazias”, e  “O desconhecido”, entre outros. 

Autor de “Crônica da Casa Assassinada”, Lucio sempre produziu a arte que refletia suas inquietudes. Ele dizia que sua escrita não era algo essencial para sua vida, mas que o fazia sentir: 

Se quisesse, poderia viver sem escrever, o que não seria nada de mais. Mas acho mais divertido escrever: resolvo até fazer ‘obras’, forçando coisa por coisa, imaginando página por página, sendo artificial ou ‘sincero’ numa grande confusão. Escrever é bom para sentir e o que quero é sentir. Há também uma outra vontade que escrever pode ajudar: a de crescimento contínuo.”

É este mesmo homem sensível, confiante e extremamente ciente dos microespaços existentes entre cada camada do mundo que escreveu também seus diários para manter-se consciente de si. Seus diários considerados “não-íntimos” chegaram a ser escritos de modo tão fragmentado que ao reuní-los, o resultado era a montagem de um enigma sobre sua alma. É o mesmo escritor que deixa em “Inácio” essa dedicatória tão carregada de emoções que fazem com que um desabafo se transborde em meras letras rabiscadas sem peso na caneta na folha de rosto de uma edição especial.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARDOSO, Lucio. Inácio: novela. Rio de Janeiro: Editora Ocidente, [194-?]. 183 p.

GUIMARÃES, Adriana Saldanha. Lucio Cardoso: um corcel de fogo e ideias. Educação Pública. Rio de Janeiro: Fundação Cecierj – Fundação Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro, 2005. Disponível em: https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/2/1/Lucio-cardoso-um-corcel-de-fogo-e-ideias Acesso em: 19 junho de 2024.

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