Dona Beija: mitos e encantamentos

Corre pelas terras do Triângulo Mineiro, na cidade de Araxá, uma lenda, ou melhor, várias lendas sobre a mesma mulher: Ana Jacinta de São José. Na boca do povo, ela carrega outro nome: Dona Beija. 

Nascida em dois de janeiro de 1800, em Formiga, Dona Beija foi uma mulher conhecida por sua beleza e sedução; artefatos utilizados por ela para adquirir grande influência na sociedade imperial em que viveu. 

Ana Jacinta se mudou para Araxá ainda bem jovem e experienciou aventuras que podem ser um pouco difíceis de acreditar. A começar por seu rapto aos 15 anos feito pelo ouvidor Joaquim Inácio Silveira da Mota. O homem, ao passar pela cidade e, vendo uma jovem tão bonita, decidiu raptá-la e mantê-la como amante em Paracatu por dois anos. Joaquim da Mota era um nome muito relevante para o Império e, em 1817, foi chamado à Corte pelo Imperador. Entretanto, não poderia levar Ana Jacinta consigo, fazendo com que a menina tivesse que retornar para sua casa, em Araxá. É lá que ela consegue estabilidade, muito embora, sua reputação fosse bastante prejudicada já que naquele momento, era vista como suja e desvirtuada por ter sido amante de um homem, ainda que aquele destino não fosse fruto de suas vontades. 

Em seu retorno, e com alguns prospectos adquiridos do tempo ao lado do ouvidor, ela resolveu construir um casarão – hoje, Solar da Dona Beija – e lá deu início a uma vida agitada, julgada moralmente pela população. Dizem que neste casarão – à época, Chácara do Jatobá – ela comandava uma casa de prostituição em que ela mesma se vendia, mas tinha o privilégio de escolher os melhores homens. Isso fez com que seus recursos e sua má-fama entre as mulheres aumentassem exponencialmente. 

Mas Dona Beija não se limitava aos rótulos e limitações impostas pelas regras sociais do Império. Mãe solteira, ela conseguiu fazer com que suas duas filhas se casassem com homens da elite e tivessem significativa melhoria da qualidade de vida. Foi nesse tempo que ela resolveu se mudar para a cidade de Bagagem (Estrela do Sul) porque existia uma crença que lá era possível encontrar diamantes. 

Além de estar na memória de milhares de pessoas que ultrapassam as fronteiras araxaenses, a vida misteriosa e cercada de mitos de Dona Beija foi debatida e ficcionalizada por inúmeros autores. Um deles foi Thomas Leonardos que tratou a mulher como uma “feiticeira” que o encantou a ponto de se imaginar tendo uma conversa com ela. Contudo, como bom advogado que era, escreveu “A feiticeira do Araxá” baseado na história oral da mulher. Segundo ele, Dona Beija preparou-se para a morte em 10 de junho de 1869, fazendo seu testamento confessando “tenho sempre vivido em estado de solteira” e compartilhando seus bens. A morte, entretanto, só a levou em 1873 devido a problemas renais. 

 

REFERÊNCIAS

CARNEIRO, Mariana. Certidão de óbito de Dona Beja é emitida mais de 150 anos após a morte. Tv Integração: G1. Araxá, 2024. Disponível em: https://g1.globo.com/mg/triangulo-mineiro/noticia/2024/03/28/certidao-de-obito-de-dona-beja-e-emitida-mais-de-150-anos-apos-a-morte.ghtml Acesso e: 19 set de 2024.

FUNDAÇÃO CULTURAL CALMON BARRETO. Anna Jacintha de São José – Dona Beja. [S.l.: s.n.]. Disponível em: https://fundacaocalmonbarreto.mg.gov.br/bio/link/3/anna-jacintha-de-s-o-jos-dona-beja Acesso em: 19 set de 2024. 

LEONARDOS, Thomas. A feiticeira do Araxá. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 1971.

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