Dona Geralda: histórias do sertão

Minha mãe era natural daqui mesmo, habitava a região de Igrejinha. Ela nasceu lá pro lado do Angical. Uma moça órfã, causa que a mãe dela morreu – quando era ainda criancinha, d’uns quatro aninhos – no parto do irmão. O pai era muito cacheiro, não  deu para criar ela, nem o irmão pequeno. Eles foram criados pelos avós. Quando mãe tava com idade de 12 pra 13 anos, seu avô foi preso e sua avó morreu, por isso ela foi acabar de criar com o padrinho. Naquele tempo, se faltasse mãe, pai, avô e avó, quem criava eram os padrinhos. A família determinava, era a lei da Igreja Católica.” p. 25

Este é o início da história de Dona Geralda, uma senhora que habita o noroeste de Minas, nas margens do estado da Bahia com Goiás, na região do Vale do Urucuia, no município de Arinos. 

Através do projeto “O caminho para o sertão”, a equipe com Isla Nakano e Renata Ribeiro habitou a casa de dona Geralda por 14 dias coletando e gravando vídeos de suas histórias contadas no quintal de sua casa. Casa que, em um mês, havia recebido cerca de 80 caminhantes que pernoitaram lá uma única noite e ouviram suas histórias.

Não tem como falar da família que construí sem falar de minha mãe. Ela foi muito importante na minha vida, me ajudou demais durante várias história de sofrimento. Quando os militares levaram as crianças pra lá, ela ficou numa situação muito pesada e cuidou de todas. Também me auxiliava com a situação de roupa, alimento, sempre. Um dia cheguei na casa dela com minha irmã e tava la boa, lavando vasilha. Depois fez chá, que ela não bebia café – tomava era chá. Falou que não tinha café para me dar e que eu era muito cafezeira. Fez também beiju e polvilho, e conversamos. No caminho de volta, eu disse pra minha irmã que ela não ia demorar a falecer, não ia durar muito tempo mais não – foi uma sensação” (p. 217).

A mulher, responsável por propagar histórias do sertão de Minas através de um recorte de sua vida na Fazenda do Moinho, conta sobre muitos momentos peculiares: “O grandioso projeto de ocupação e desenvolvimento do Vale do Rio Urucuia, a cidade projetada por Niemeyer que não aconteceu, a perseguição a integrantes do Partido Comunista Brasileiro que pernoitavam ali,  a vida de uma professora da escola rural torturada apenas por estar na mesma casa…”

O livro “A porta aberta do sertão: histórias da Vó Geralda” traz assim a vida de Dona Geralda no entremeio da história de luta contra a opressão no sertão, resgatando a memória e enriquecendo a literatura e a história brasileira. 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

OLIVEIRA, Geralda de Brito; NAKANO, Isla; RIBEIRO, Renata. A porta aberta do sertão: histórias da Vó Geralda. Belo Horizonte: Relicário, 2024. 235 p

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